Seja mediano, seja herói

Luiza Lemos
3 min readJan 14, 2024

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Meme da Melted Videos publicado em janeiro de 2024 | Reprodução/Instagram

Esses dias deparei com um meme da página Melted Videos um tanto diferente. Era um bonequinho no estilo daqueles gráficos dos anos 2000, deitado com as pernas cruzadas e com a cabeça sobre os braços com a legenda: Seja Mediano, Seja Herói.

O meme faz alusão à icônica obra de Helio Oiticica de 1968: Seja Marginal, Seja Herói. Na arte, Cara de Cavalo, um homem acusado de matar um policial, está posicionado deitado como se estivesse crucificado e morto.

Obra de Helio Oiticica | Reprodução/Google

Enquanto em 1968 há o mito do marginal heroico, por transgredir as regras impostas pela sociedade e ser um marginal como dito no dicionário, 56 anos depois, parece que a marginalidade está mais palpável e bem diferente da definição social que conhecemos.

A transgressão dos dias atuais que traz a alcunha de herói é simplesmente ser mediano. Em um mundo repleto de janelas para a vida de tantos, que parecem ser extraordinárias, fica cada vez mais insuportável a ideia de ser comum. Parece até ser uma lei das redes sociais sempre ter algo a mostrar, uma selfie nova, um projeto inédito, uma vida sempre acima da média.

E quem se sujeita a aceitar a realidade que está e não se pressionar para ser sempre extraordinário, transgride essa regra da ‘nova era’ — que nem é uma grande novidade, as redes sociais estão aí há um bom tempo.

Mas é justamente no campo das redes sociais que um movimento contrário surge: o de aceitar ter uma vida mediana. Aquela rotina comercial, das 9h às 17h, que não espera muitas novidades e que a vida como ela é, já é extraordinária. São conteúdos escondidos sob os infinitos vídeos de coaches, podcasts de empreendedorismo e páginas de influenciadores de lifestyle que têm várias empresas e aquela ‘vida perfeita.

Muito além da Melted Videos, já me deparei algumas vezes rodando o feed com o perfil de um norte-americano mostrando como a rotina mediana já é ótima para ele e que isso basta.

E até celebridades já passaram pela sensação de estar falhando em ter uma vida deslumbrante. Um exemplo é o comediante Leandro Hassum, que já atuou, dublou, dirigiu e trabalhou em obras audiovisuais memoráveis e, mesmo assim, se sentiu angustiado ao ver vídeos de coachs ensinado a “produzir mais que 100%”. No mesmo vídeo, Hassum cita que isso não é vida e que a nossa carga de trabalho e responsabilidades atual já é suficiente.

No fim, o que Hassum, a Melted e o norte-americano mostram nos poucos segundos que o Instagram permite ter atenção é algo que esquecemos: não é pecado ter uma vida comum.

Por isso, em um mundo onde todos precisam ser especiais e extraordinários, seja marginal: viva do modo que bem quiser, mesmo que essa vida seja mediana, chata e criminosa para a sociedade e para as leis da vitrine virtual.

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Luiza Lemos
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Written by Luiza Lemos

Refletindo sobre o básico, achando o extraordinário no comum, ou não.

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